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Capadócia – Preferência Nacional

Paulo C. A. Benetti é consultor em Criatividade, Inovação e Estratégia, que aproveita viagens a trabalho para visitar e curtir outros lugares, com outros olhares.

Hoje ele nos leva à Capadócia, na Turquia, e nos próximos domingos viajaremos com ele por Lima, Cairo, Istambul e à Sagrada Família em Barcelona.

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Estando na Turquia não se esqueça de visitar a Capadócia. De lá é São Jorge que se tornou um dos santos mais badalados. Padroeiro da Inglaterra, de Portugal, de Moscou, do Corinthians, e dizem que até do Rio de Janeiro extra-oficialmente. Digamos que é uma eminência parda no mundo religioso carioca. Querido pelos católicos, ortodoxos e anglicanos.  Enfim, um santo popular. Isto sem precisar de tuitar ou facebucar.  Os dragões da maldade que se cuidem.

A Capadócia tem história e histórias sensacionais.  Por séculos, tempos atrás, tiveram que cavar o chão para construir abrigos contra os invasores.  Construíram cidades subterrâneas.

Andar por aquelas cavernas e imaginar como podiam viver milhares de pessoas é quase impensável. Nosso grupo era uma babel: uma família do Nepal (nem sabia que havia famílias no Nepal, e olhava para eles com uma curiosidade imensa, para entender os costumes. As garotinhas nem aí, só mandavam mensagens pelos celulares); um jovem muito forte do Afeganistão (também pensei que lá tava todo mundo metendo bala para todo o lado e ninguém tinha tempo para fazer turismo); e outros menos votados – Inglaterra, Sudão, Egito, Coréia do Sul, Peru e Brasil.

O guia, muito falante (como todos os guias), gostava de falar a palavra Anatólia. Tudo tinha Anatólia no meio. Já pensando que iríamos encontrá-la em uma das cavernas, ele aproveitou para explicar que este nome designa a parte da Turquia que fica na Ásia – ou seja, 95% daquele país.  Ou seja, a Turquia asiática chama-se Anatólia.

Passeamos por cavernas construídas há mais de mil anos e ficava bestificado como o guia sabia ainda hoje onde ficava a cozinha; onde o pessoal se reunia para comer; em que andar ficavam os animais. Como saber tudo isto depois de tanto tempo?  Mas os guias são para isto, se não sabem, inventam. O que para mim é o melhor – adoro a imaginação.

O conjunto de cavernas formava uma cidade. Alguém disse que chegavam a ter mais de 10.000 moradores.  Isto me parece a mesma coisa quando falam o número de pessoas na praia de Copacabana durante a passagem do ano; de passeatas; de aglomerações políticas.  Sempre multiplicam por dez, vinte, sei lá.

Em algumas montanhas também existiam cavernas que foram monastérios ou conventos.  Havia salas de aula!  Não relegaram a educação mesmo tendo que se esconder dos invasores. (MEC !!!! preste a atenção nisto antes que os brasileiros virem povos das cavernas.)

O turismo resolveu tirar partido e montou uma rede de hotéis em cavernas, construídas para isto. Pois não resisti e lá estava num imenso quarto com imenso banheiro, com tudo que tinha direito (inclusive ar condicionado e internet). Um troglodita hi-tech.

As pessoas locais são muito simpáticas.  As cidades, Nevsehir e Goreme, são pequenas e quase tudo voltado para o turismo, e tudo com tradução para o inglês (diferente de Istambul).

Mas não tinha ido lá só para ver somente cavernas. Queria passear em um balão.  Nunca havia feito e como tenho medo de altura achei que era uma boa oportunidade de enfrentá-lo.

Muito cedo, por volta das cinco da manhã, uma van passava pelo hotel e seguia recolhendo os futuros passageiros dos balões.  Levava todos até um ponto de concentração, onde lá estavam centenas de pessoas e dezenas de outras vans. Ali todos tomavam o seu café da manhã. Modesto mas gostoso.

Em certo momento uma senhora avisa para qual van devemos dirigir-nos.  As vans têm nomes dos pilotos dos balões escritos nos vidros. O do meu balão era o Mustafá. No caminho explicava algumas coisas.  Disse o seu currículo, falando um inglês bem claro.  Estudou pilotagem nos Estados Unidos (isto não é nenhuma vantagem, até os pilotos dos aviões de 11.9 também estudaram). Viajamos uns quinze minutos.

O sol já estava pintando no horizonte e a lua cheia, já não resistindo tamanha competição, procurava seu refúgio. Foi descansar para, à noite, voltar com toda a sua sedução.

Em um lugar simples numa mata rasteira o balão tomava corpo.  Estava com a curiosidade de um menino e a preocupação de um adulto. “Como vai ser minha reação quando esta coisa subir?”.

Um grande cesto é nossa nave carregada pelo balão.  É nele que se viaja. Retangular e tem quatro cantos cercados onde, em cada um, ficam quatro pessoas.  Ou seja, éramos dezesseis passageiros.  No meio estão os bujões de gás que eram acionados pelo piloto para dar movimento ao lindo balão.

Entramos todos. Algumas pessoas precisaram de ajuda, pois o parapeito era alto.  Mustafá dava as explicações gerais de segurança e de comportamento. Tudo muito simples e fácil.

Antes mesmo que o meu coração informasse que tava bombeando mais adrenalina, percebi que o balão já estava no ar. Como tudo que é sólido flutua no ar, me senti desta forma: em estado de levitação.  Não parecia voar, mas flutuar.  Um momento de rara felicidade.  Se o Céu for daquele jeito, topo!

À medida que o balão subia, dava para ver que os outros balões, uns cinqüenta, também subiam.  O horizonte ficou cheio de balõezinhos.  Uma beleza! Alguns bem mais altos, outros não.  Mustafá explicava que primeiro um grupo viajava pelo vale, mais embaixo, outros seguiam acima esperando sua vez.

Fotos eram disparadas na mesma quantidade que suspiros eram dados.  Uma miríade de expressões de contentamento com cada coisa que se via.

Uma hora e meia depois estávamos descendo em um local, onde algumas garrafas de champanhe esperavam. Rapidamente o pessoal de terra desinflou o balão e despachava o caminhão que o levava.  Tomamos nossos champanhes e celebramos nossa alegria.  E ainda nem havia dado oito horas da manhã.

Depois deste passeio um descanso era necessário para deixar que toda aquela experiência passasse pelos poros e ficasse registrada para sempre em nossas células.  É simplesmente inesquecível principalmente para quem tem medo de altura.

Mas turista não pode parar. Se para, desliga. É igual brinquedo de criança. Então, à noite, a Dança dos Dervixes esperava para o seu espetáculo.

É uma dança muito delicada, ao mesmo tempo muito simples pois a maior parte do tempo ficam a rodar, parecendo discos por causa da saias longas. Na tradição sufi esta dança representa a ligação entre o divino e a vida terrena.  Com a mão direita o dervixe recebe a graça e com a esquerda espalha pelo mundo. E giram sem parar.  É um meio de alcançar a meditação mais elevada.  Não é um espetáculo típico que o turista gosta. É repetitivo e a música com pouca variação. Mas é tocante como eles giram e giram em busca do divino.

A Capadócia é divina!

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